segunda-feira, 5 de julho de 2010

adeus

alguns fios brancos refletiam a luz fraca da sala de jantar, era mesmo o sorriso que iluminava o ambiente, não existia lâmpada tão forte e tão alva. assim como há anos, era uma noite qualquer, mais um sorriso, mais pão, mais café. tudo se somava em quantidades ordinariamente comuns. a esposa nem deu o beijo de despedida, era uma viagem curta, abraçou-o e deu sua bênção, bênção essa que só quem é mãe pode dar. ungido, seguiu iluminado por uma lua turva e por amarelos-postes irregulares, seguiu estrelas que nem se via, era chuva. abençoado mais uma vez, por chuva, se foi, sem pensar em muita coisa, não passava de uma viagem comum: rádio de fundo, pé no acelerador, tosse, espirro, sono.
sinto em interromper a história, contudo acompanhei pedaços, talvez eu tenha cochilado, por fim acordei . apesar das telhas, portas, janelas, paredes, cobertas, e todas as demais barreiras físicas, me senti à noite no deserto. não me senti em pé, nem sentado, eu era um ponto que congelava no deserto, acordado em pleno dia, e como qualquer ponto não existia posição. as pernas, mesmo sem saber que eu andava, fraquejavam, percebi o desequilíbrio ao observar o chão se aproximando e se afastando, tudo muito lento, afinal não se rasga um corpo por completo de uma só vez.
o carro, a terra, o vento, tudo chegava ao mesmo tempo no meu rosto, minha face congelou. não movia um músculo: enquanto o vento mantinha meus olhos abertos, o farol do carro me cegava e a terra arranhava tudo que poderia ser visto. o acidente chegava cada vez mais perto de mim, até que entrou, se apossou, capotou em mim, rasgando o que podia e arranhando o que aparentemente estava ileso.
são tantos olhos em cima de mim, nenhum me vê. não estou ali.




fonte.

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